O que revelaram as justificativas dos jurados sobre o Carnaval 2018

Foto: LIESA

A Liesa liberou na última segunda-feira as justificativas das notas dadas pelos jurados que avaliaram as escolas de samba do Grupo Especial no Carnaval 2018. O que era usado antes para avaliação das escolas, entender as notas e buscar corrigir os erros, hoje virou uma espécie de segundo round dos debates a respeito do resultado. E a culpa é da própria Liga, que permitiu mudar o resultado do Carnaval 2017 a partir delas – a história da Mocidade, você deve se lembrar…

Os mapas de apuração de cada um dos 36 jurados que atuaram no Carnaval 2018 foram publicados no site da Liesa. Funciona assim: todas as notas diferentes de 10 precisam ser justificadas. Os textos dos jurados nos permitem chegar a algumas conclusões. Vamos a elas.

1) A Grande Rio foi inocente ao forçar a virada de mesa

A reunião que decretou o não rebaixamento da tricolor de Caxias, com apelo do prefeito daquele município e uma manifestação extemporânea da Prefeitura do Rio foi um desgaste desnecessário, sobretudo para a escola que saiu do episódio com a imagem arranhada.

Por que eu digo isso? Porque os jurados erraram com a Grande Rio. Dois julgadores do quesito Alegorias e Adereços descontaram pontos por causa do sexto carro que quebrou e só passou na avenida depois da escola – rebocado. No entanto, o regulamento instrui os jurados a só avaliarem o que viram e não o que não viram. Os jurados de Enredo, esses sim, deveriam despontuar a escola porque a falta do carro prejudicou a narrativa, o que eles fizeram. Mas os de Alegoria não poderiam ter dado essa alegação. A escola teria argumento para impetrar um recurso e pedir a anulação das notas, como fez a Mocidade em 2017.

2) Falta critério

Quem lê as justificativas nota com alguma facilidade que não há uniformidade no critério de julgamento. Aqui cabe explicar um detalhe: ao contrário do que muitos imaginam, o sistema de julgamento das escolas de samba não é feito uma prova. Nesta o aluno chega pra fazer o teste com nota zero. Responde as questões e ganha uma nota de acordo com o desempenho. No caso das escolas, elas entram na avenida com nota máxima em todos os quesitos e vão perdendo décimos ao longo da apresentação de acordo com os erros que cometerem. E aí está o “x” da questão: quanto vale o erro.

Em alguns quesitos, o jurado aponta um problema e tira 0,2 de uma escola; para outra aponta duas questões, mas desconta 0,1. Por que? Só ele sabe e raramente há uma tréplica a respeito dos motivos que levaram um jurado a penalizar escola A ou B.

Existe um curso de jurados e um manual do julgador, ao qual todos nós temos acesso. No caso de enredo, por exemplo, pede que o jurado considere dar 5 pontos para a concepção e 5 para execução. A São Clemente, por exemplo, perdeu pontos unanimemente por conta dos tripés que faziam alusão ao incêndio e à reconstrução da Escola Nacional de Belas Artes. Uns tiraram 0,1 e outro 0,2. A Beija-Flor perdeu 0,1 de Alegorias porque o jurado não conseguiu ver a encenação do carro. Outro criticou a falta de carnavalização, ou seja, considerou realista demais, uma crítica pertinente que se fez ao desfile da escola. Este é um defeito considerado grave pelos analistas de carnaval, mas o desconto foi o mesmo 0,1.

Como resolver isso? Tanto o curso quanto o manual precisam tentar reduzir o espaço para subjetividades, o que também protegeria escolas menores de sofrerem com rigor excessivo. Usando os exemplos citados: falta de carnavalização poderia descontar 0,3, enquanto uma falha de acabamento grave, ou várias pontuais, valeriam 0,1 ou 0,2.

3) O caso do FLAM e do Rulo

Além da falta de critério, dois termos utilizados nas justificativas chamaram atenção das pessoas e viraram piada instantaneamente na internet. Uma ocorreu no jugalmento de Bateria da Portela. O jurado escreveu: “Faltou um pouco de sonoridade na caixa, especificamente no destaque do RULO.”. Rulo??? Sim, é uma técnica de percussão para prolongar a sonoridade de um instrumento.

A mais famosa foi a justificativa de outro jurado de bateria para tirar 0,1 do Salgueiro: “Na repetição do refrão (…) faltou precisão, gerando um FLAM”. Obviamente que o tal Flam virou vedete nas redes sociais. Mas o termo existe. A palavra vem do inglês e é uma técnica usada em instrumentos de percussão na qual uma das baquetas atrasa o ataque, gerando um efeito, como se fosse um descompasso. Por que ele não gostou? Não se sabe…

Muito se fala sobre o julgamento e nós todos que vimos o desfile temos nossas opiniões particulares. Em benefício dos julgadores há que se dizer: o desfile de escolas de samba é uma experiência sensorial, antes de mais nada. Mas também é multidisciplinar e técnica como poucos eventos culturais no mundo.

Em um mesmo envelope, se manifestam arquitetura, desenho, artes plásticas, escultura, modelagem de roupas, materiais diversos, iluminação, música, com harmonia e percussão, narrativa, etc. Tudo passa na nossa frente às vezes por uma fração de minuto. É um mundo de coisas para nossa mente apreender.

Por mais que os julgadores tenham um livro detalhando com o roteiro do desfile, há muito pouco tempo para avaliar uma série de coisas. E logo depois vem outra escola que traz um universo temático, estético diferente. Não é fácil! Por isso mesmo, é que é preciso mais critério e mais treinamento. Continuaremos sonhando, porque os velhotes que decidem virar mesa nas plenárias pós-carnaval, aparentemente, não conseguem entender isso.

09 de mar de 2018

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