Prefeito do Rio fala em cortar verbas e escolas suspendem desfile 2018

Tudo começou com um post do presidente da União da Ilha no Facebook e na última segunda o mundo do samba recebeu a confirmação. O prefeito do Rio, Marcello Crivella, que sumiu do mapa no Carnaval, voltou a prestar atenção nas escolas de samba. Para dizer que vai cortar 50% da subvenção aos desfiles: isso significa R$ 1 milhão a menos para cada uma das 13 agremiações do Grupo Especial e menos dinheiro também para os grupos de acesso.

Segundo o bispo-prefeito, o Carnaval precisa fazer um sacrifício em nome das criancinhas. Isso mesmo, você não leu errado: o dinheiro vai ser “melhor empregado” para aumentar a subvenção da pouco mais de centena de creches municipais, subindo dos atuais R$ 10 pra R$ 20 por criança.  Crivella, com mal disfarçado sarcasmo, afirma que diante da crise e da redução da subvenção, as escolas deveriam apelar para a criatividade.

Veja entrevista do prefeito

Logo que botou a boca no trombone, Nei Filardi, presidente da Ilha avisou que a escola não desfilaria em 2018 caso o prefeito mantivesse o corte. Na quarta-feira, a Liga Independente se pronunciou suspendendo os desfiles do Carnaval 2018 até que se resolva o impasse. A irritação da maioria dos dirigentes tinha uma agravante: a maior parte apoiou o bispo nas eleições municipais.

Leia nota da Liga Independente

As escolas do Grupo Especial gastam em torno de R$ 6 milhões a R$ 8 milhões no desfile. Orçamentos mais caros chegam a R$ 10 milhões. Portanto, o dinheiro da Prefeitura não é a única renda de que dispõem, mas faz muita diferença, principalmente em tempos de crise. Para as escolas menores, com menos visibilidade, a perda da subvenção pode realmente inviabilizar o desfile no Carnaval 2018.

O que mais irrita as escolas é a hipocrisia de jogar o público contra o povo do samba, afinal quem poderia ser contra dar mais dinheiro para criancinhas? O erro aí é chamar o Carnaval de uma DESPESA. É simplesmente o principal evento turístico do calendário e grande gerador de empregos, especialmente nos meses finais de preparação. Segundo dados da Riotur, o Carnaval 2017 movimenta cerca de R$ 3 bilhões em divisas para a cidade na economia direta e indireta, gerando inclusive impostos. Portanto, no manual de qualquer gestor isso tem de ser considerado como investimento, não despesa. O valor da “economia” total, em torno de R$ 20 milhões, é um quarto dos gastos (esses sim) do gabinete do Prefeito. Segundo o Portal da Transparência do Rio, o orçamento reserva cerca de R$ 80 milhões para essa rubrica em 2017.

O dinheiro poderia ser tirado de outras fontes, obviamente. Por exemplo, levantando a isenção de IPTU para templos religiosos pentecostais, já que se está falando de “sacrifícios”. Infelizmente, as escolas nem podem se dizer surpresas. Sabem do histórico de conflitos com algumas seitas evangélicas, que consideram coisa do demônio as ligações das agremiações com a umbanda e o candomblé.

As escolas continuam preparando sinopses e explicando seus enredos para que os compositores componham seus sambas para o Carnaval 2018. A suspensão é uma tática de negociação. De qualquer forma, surgiu uma ótima oportunidade de o Carnaval se dar ao respeito e se repensar, viabilizando modelos de financiamento que não dependam da ideologia do prefeito no poder, sobretudo trazendo em peso de volta para dentro das escolas o povo que se afastou, melhorando o julgamento, dando menos importância ao visual e mais aos fundamentos do samba.

E ainda que o desfile venha a se tornar 100% autossustentável, o governo não pode dizer que não tem nada com isso. Afinal, as escolas de samba são uma manifestação popular tradicional e patrimônio cultural da cidade.

A turma do bispo, na verdade, mira mais longe, na opinião dos analistas. Ataca o simbolismo do carnaval, para o professor Luiz Antônio Simas. Eles são contra a diversidade e querem desqualificar a maneira carnavalesca de ver o mundo “entre tambores que batem, corpos que dançam e gentes que amam”.

16 de jun de 2017

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