Escolas de samba também funcionam como aulas de história divertidas

 

Aproveitando o feriado do 7 de Setembro vale fazer uma pequena reflexão. Clique no vídeo acima e escute enquanto lê este texto. Tem aula de história no samba? Tem sim senhor! Vamos falar um pouco desta tendência das escolas de samba de servirem para revelar fatos e personagens da história do Brasil nos enredos e sambas através dos anos.

A ideia de enredo no desfile surgiu nos anos 30, por iniciativa de Paulo da Portela. Curiosamente, em Teste ao Samba, de 1939, todos os componentes foram vestidos de professores e havia o rudimento de uma alegoria na forma de quadro-negro. A relação de proximidade (e dependência) das escolas com o poder público fez com que se fortalecesse a vertente de usar os desfiles para contar a história do Brasil, geralmente sob o ponto de vista oficial – vale lembrar que quando o concurso de escolas era uma novidade, estávamos em plena Era Vargas e o Rio era capital.

A partir dos anos 40, os sambas claramente se aproximaram do enredo. A proibição de improvisar versos da segunda parte do samba, como era comum até então, contribuiu para diferenciar o samba-enredo do samba de terreiro ou de partido alto. Eram comuns escolas cantando a Princesa Isabel, Dom João, Duque de Caxias entre outros. Um dos primeiros sambas-enredo que passou a ser cantado fora do desfile, como música de carnaval, foi Exaltação a Tiradentes, do Império Serrano, de 1949.

O Império Serrano, aliás, foi o grande influenciador de um estilo de samba que ficou conhecido como lençol. Tinha letra bastante grande e contava um fato histórico de maneira detalhada. Seus grandes compositores Silas de Oliveira e Mano Décio da Viola eram muito bons nisso. Ficaram muito famosos nesta fase Os Cinco Bailes da História do Rio, Heróis da Liberdade e Sublime Pergaminho, sobre a história da escravidão no Brasil.

Apenas nos anos 1950 que os temas afro começaram a aparecer nas escolas e foi só depois da chegada de Fernando Pamplona no Salgueiro que personagens menos oficiais da nossa história começaram a ganhar espaço, como Zumbi dos Palmares, Dona Beija, Chica da Silva, Chico Rei, A chega deles abriu o leque de opções das escolas, que passaram também a cantar lendas e festas populares do Brasil.

As escolas cresceram de tamanho e de prestígio depois disso. Nos anos 1970, os sambas ganharam refrões e ficaram mais curtos, o que facilitou sua assimilação pelo grande público. Mas a história continuava ali. A Beija-Flor, recém-chegada ao desfile principal cantou em 1975 um samba que celebrava os dez anos do regime militar, enquanto a pequena Em Cima da Hora, no carnaval seguinte, apresentou Os Sertões, contando a história da Guerra de Canudos.

No auge de sua popularidade nacional, o samba-enredo incorporou o tom crítico das marchinhas e surfou a onda da redemocratização. A Caprichosos de Pilares e São Clemente fizeram sucesso com sambas que criticavam, por exemplo, o excesso de americanização da cultura brasileira e até os políticos, em Eu Prometo (1987) ou a situação do menor abandonado em Capitães do Asfalto (1987). A Beija-Flor já na posição de grande escola brilhou falando da pobreza em Ratos e Urubus (1989), mas perdeu o título para a Imperatriz Leopoldinense cantando os 100 anos da República.

Nenhuma destas ondas excluiu a anterior, ou seja, cada nova tendência incorporou possibilidades ao universo do samba-enredo. E nos anos 1990 chegamos a um ponto em que os enredos passaram a abordar histórias particulares, personagens pouco ou nada conhecidos. Um exemplo foi o pintor russo Langsdorff, que fez um trabalho primoroso de pinturas do interior, da fauna e flora brasileira e foi tema da Estácio em 1990. Um dos grandes personagens da imprensa nacional, Assis Chateaubriand, foi tema da Grande Rio em 1998. A exigência de falar de temas nacionais nos desfiles deixou de ser obrigatória em 1997. Mesmo assim, nunca foi ambandonada.

 

Vale a pena ouvir também este samba, Langsdorff, Delírio na Sapucaí 

 

Em 2018 teremos enredos críticos, como na Beija-Flor e no Tuiuti, e da Portela, que conta a história de um grupo de judeus que fuguiu de Pernambuco e participou da fundação de Nova York no século 17. Sim, escola de samba ajuda a conhecer nossa história, oficial e oficiosa. Não por outra razão, são consideradas patrimônio imaterial da cultura carioca.

08 de set de 2017

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