Se depender dos sambas, o carnaval 2017 pode ser histórico

Se as rádios brasileiras tocassem menos “universitários” e retomassem o antigo hábito de esquentar as turbinas para o carnaval tocando sambas-enredo a partir de dezembro, teríamos um verão animado. A crise econômica passou longe da inspiração dos compositores, que produziram a melhor safra de sambas-enredo em muitos anos.

As escolas passaram a semana passada na Cidade do Samba produzindo o CD oficial. Como ele é “gravado ao vivo”, cada agremiação reúne um coro de componentes bem ensaiados e solta a voz. Só por esta pequena amostra, dá pra prever que o carnaval 2017 vai ser quente. Não só as músicas são boas, como a maioria das escolas está feliz com suas escolhas, o que é garantia de componente cantando muito na avenida.

No samba existe uma gíria de que certos sambas são “pula-faixa”. Ou seja, quando começa a tocar certa música no CD, a gente pula direto pra próxima de tão chata. Só que em 2017 não teremos nenhum.

Certo, Mestre. Mas fala logo, quem é o melhor? Então aí vai de cara. A disputa de samba do ano deve ficar entre Mocidade e Beija-Flor. A primeira, tinha uma sinopse de enredo lamentável, mas os compositores arranjaram soluções engenhosas como nos versos em que a escola promete promover um encontro entre Alá e Xangô. Sem contar que, depois de anos, Mocidade rima com Sherazade, em vez do tradicional “cidade”. O “Sonha Mocidade”, que conclui o refrão principal, sintetiza o desejo da escola de voltar a ser protagonista.

Sinta a energia da Mocidade na gravação:
https://www.youtube.com/watch?v=0BYwozFGX_k

Se a Estrela-Guia tem um sambaço, o que dizer da poética obra da Beija-Flor, sobre o romance Iracema, de José de Alencar? Tem um refrão longo, ousado para estes tempos de carnaval pipoca, ainda mais com a redução absurda do tempo de desfile para 75 minutos. Mas é lindo.

Gravação do coro da Beija-Flor:
https://www.youtube.com/watch?v=2Y1ok0xcs4U

Mas esta briga promete ser quente. Como já havia dito aqui, o refrão principal do samba da Ilha é contagiante demais e a melodia muito boa. A Portela escolheu um samba-poesia, que fala dos rios do mundo fazendo uma analogia com o rio que passou em todas as vidas de quem gosta de carnaval, a própria escola. É um achado e, se os jurados comprarem a ideia, a Águia deve continuar gabaritando no quesito.

A gravação da Portela:
https://www.youtube.com/watch?v=bFhkIvH740c

E o da Ilha:
https://www.youtube.com/watch?v=4oHFenZVFtA&index=14&list=PL0wy7VkP9yX-gI-OdQGy7yz-FHMSjhzLA

A Mangueira e seu sensacional enredo sobre a fé do brasileiro, escolheu uma música que não era a minha preferida. Acho a letra inferior ao samba derrotado. Só que a escola preferia esse. E quando a escola “compra” seu hino, segura. Outra comunidade forte é a do Salgueiro, que também está empolgada com seu samba. A letra é melhor que a música, mas os versos que levam ao refrão mexem com o orgulho da escola, o que pode fazer a diferença na hora do canto.

Veja o Salgueiro gravando o coro do samba na Cidade de Samba:
https://www.youtube.com/watch?v=RTT0SLQkoik

Tijuca, Vila e Imperatriz também escolheram o samba que a comunidade queria. Especialmente o do Xingu, da verde e branco de Ramos é outra bela obra.
E pra quem torceu o nariz para o enredo de Ivete Sangalo, a Grande Rio escolheu um samba muito fácil de cantar e um refrão que “gruda na cabeça”. Com a cantora divulgando o hino da escola em todos os shows que faz, a letra deve estar na boca de muita gente até o carnaval. Tuiuti e São Clemente são, na minha opinião, os menos empolgantes. Mas nada de pular a faixa. rs

Só que o samba-enredo é um gênero diferente. Quanto mais você ouve, mais você descobre nuances. E uma coisa é a música gravada no CD. Ao longo dos ensaios da quadra, os de rua e os oficiais, que ocorrem na Sapucaí a partir de dezembro, tudo isso pode mudar. Na hora do desfile official, algum samba que não era o preferido de muitos, explode e acontece.

Para nós, carnavalescos, o que vale é: 2017 vai ser um grande ano para quem é apaixonado por esta cachaça musical que não tem o destaque na mídia que merecia perto da produção e qualidade. Mas esta é outra história…

28 de out de 2016

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