A sinopse poética da Estácio para Gonzaguinha
Por Marcelo Hargreaves
Um livro, uma peça de teatro ou um filme prendem a atenção do público porque falam a respeito de algum drama humano. O desfile de escola de samba também conta uma história, chamada enredo. Apesar da crítica bem-humorada do jornalista Stanislau Ponte-Preta, que inventou a expressão “samba do crioulo doido”, o enredo é uma estrutura narrativa e a sinopse sua expressão.
A sinopse é como o roteiro de um filme, em cima do qual os carnavalescos vão organizar as alas, criar fantasias e o conjunto alegórico para contar o enredo. É também um guia de inspiração para a ala de compositores. Quanto mais bem feita ela for, maior a chance de a escola levar um samba inspirado para a Sapucaí.
Quem começou bem neste quesito para o ano que vem foi a Estácio de Sá. Os carnavalescos Chico Spinoza e Tarcisio Zanon se reuniram nesta quarta (4) com os compositores para a leitura e explanação da sinopse. O enredo “É! O moleque desceu o São Carlos, pegou um sonho e partiu com a Estácio!” homenageia o compositor e cantor Gonzaguinha, filho de Luiz Gonzaga.
A sinopse escrita por Zanon e Spinoza é poética e, ao mesmo tempo, permite entender toda a estrutura que os dois carnavalescos pensam para o desfile. O uso de trechos de músicas de Gonzaguinha deixa o texto interessante e dá um monte de referências para os compositores utilizarem no samba-enredo.
Leia um trecho:
Setor 1 – O moleque do Morro do São Carlos
Era domingo de Carnaval
O São Carlos estava em festa
O moleque acabou de chegar
Acreditava na vida
Na alegria de ser
Nas coisas do coração
Nas mãos, o muito a fazer
Havia um fogo em seus olhos
Um fogo de não se apagar
Pensava que era um guerreiro
Com terras e gentes a conquistar
Ô, Dina
O menino desceu o São Carlos
Pegou um sonho e partiu
Só quis saber como é
Qual é?
As respostas estavam nos papéis
Que embrulhavam os peixes
Com as composições escritas por Pafúncio
O vendedor de caranguejos
Com ele o moleque então
Descobriu a Escola de Samba
O que é o Asfalto
A passarela das fantasias
Pierrot, Arlequim e Colombina.
Depois de tanta folia
A lama dos sapatos é a medalha
Que ele tem pra mostrar
Passado é um pé no chão e um sabiá
Presente é a porta aberta
E futuro é o que virá.
Leia no site da Estácio de Sá a íntegra da sinopse.
Não há um padrão para estes textos. Podem ser compostos em prosa ou em verso, descritivos ou poéticos. O importante é indicar a linha narrativa do enredo e isso a sinopse do Leão (símbolo da escola) deixa claro.
O primeiro setor falará da infância do cantor, nascido no Rio e deixado por Gonzagão para ser criado pela madrinha Dina. Pafúncio era um vendedor de caranguejos e compositor da Unidos de São Carlos, nome da Estácio na época. O uso da palavra moleque no título e no texto faz referência ao selo independente que Gonzaguinha lançou em 1986.
A divulgação desse texto costuma ser um evento nas escolas, o pontapé inicial para o carnaval 2017. Fosse vivo, Gonzaguinha estaria provavelmente cantando: “eu acredito na rapaziada” da Estácio de Sá.
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