Mesmo realizados de última hora, ensaios técnicos mostram sua importância

No último domingo estava chovendo muito no Rio de Janeiro. Ao contrário do que se poderia imaginar, o Sambódromo recebeu um público muito bom para assistir a São Clemente, Mangueira e Portela. A escola de Botafogo teve de desfilar em meia pista, porque o sistema de escoamento da pista da Marquês de Sapucaí deve estar sem manutenção desde sempre e ela ficou parcialmente submersa. Esse fato é bastante simbólico da importância que os sambistas e seus apaixonados torcedores dão aos Ensaios Técnicos.

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Ensaio técnico da São Clemente – quem estava filmando teve de interromper por volta dos 45 minutos por causa da chuva

Desde que começaram a ser realizados, no começo do século, entraram para o calendário da cidade e de quem ama o carnaval. O fato de não terem acontecido em 2018, decepcionou muita gente que não consegue ingresso e podia sentir um gostinho das escolas, mesmo sem fantasias. Espera-se que depois das demonstrações que ocorreram esse ano, governantes, dirigentes e investidores percebam que essas prévias do carnaval fazem bem ao carioca.

O ensaio técnico é um treino parcial. As comissões de frente não entregam o jogo e fazem uma coreografia de marcação apenas. A oficial costuma ser um segredo que poucos conhecem dentro de cada escola. Já os casais de mestre-sala e porta-bandeira podem ou não usar a ocasição para testar sua coreografia. O mais importante é mostrar ao público o quanto estão entrosados.

Como o contigente das escolas só fica completo mesmo no dia do desfile, o ensaio permite um teste para a evolução que é tanto mais eficiente na medida em que a escola consegue mobilizar sua comunidade para comparecer em peso. A Portela impressionou a todos no último domingo quando dava a aparência de ter desfilado com um número de componentes bastante parecido com o que virá na segunda-feira de carnaval.

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Trechos do ensaio técnico da Portela

A grande serventia do ensaio técnico é sentir a temperatura de cada escola. Digamos que cada enredo funciona como uma campanha política. Você cria uma plataforma e espera seduzir primeiro os segmentos da escola e, conforme os meses vão passando, os frequentadores e depois os torcedores e admiradores do carnaval em geral, quando o samba é divulgado.

Seguindo este raciocínio, o ensaio seria então uma espécie de primeiro turno. Dá pra perceber se os componentes gostam ou não do samba, se a bateria está entrosada, se as bossas realmente empolgam quem desfila, se a harmonia da escola é favorecida ou não. Esses aspectos dão um indício do quanto a “alma” de cada agremiação está realmente empenhada em defender o enredo e o samba no desfile oficial durante o carnaval.

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Trechos do ensaio técnico da Unidos da Tijuca

Obviamente, toda competição acirrada gera interesse e até para isso os ensaios técnicos são interessantes. Porque os “analistas”, especialistas, jornalistas acostumados à cobertura e os palpiteiros de plantão podem gastar algum tempo se dedicando a fazer previsões sobre supostos favoritismos a partir do desempenho das escolas. É um pouco a história do “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. As escolas de samba precisam de promoção, de voltarem a estar na boca do povo e a realização dos ensaios técnicos contribui para isso.

Até agora nove escolas já ensaiaram: Vila isabel, Mocidade Independente, Unidos da Tijuca, Grande Rio, Viradouro, Salgueiro, São Clemente, Mangueira e Portela. Ainda faltam ensaiar Ilha, Imperatriz, Império Serrano, Tuiuti e Beija-Flor. Deu para perceber alguma tendência?

Além de espelharem a felicidade da comunidade do samba de se reencontrar nos ensaios, tivemos duas escolas que fizeram apresentações com muita autoridade: Tijuca e Portela parecem prontas do ponto de vista de canto, com comunidade afiadas para entrar na avenida, se o desfile fosse amanhã.

Outra escola que está feliz da vida com sua “campanha” é a Viradouro, que tem Paulo Barros e Mestre Ciça na equipe para tentar o feito de alcançar o desfile das Campeãs, logo no primeiro ano depois de voltar ao Especial. A última vez que isso aconteceu foi no ano 2000, quando a Unidos da Tijuca voltou à elite e abocanhou o quinto lugar com um belo desfile. O samba da escola de Niterói foi incorporado pela comunidade e a vermelho e branco deve fazer um desfile quente.

Mangueira e Salgueiro também fizeram apresentações para mostrar suas credenciais para tentar encantar o público e os jurados. As duas comunidades gostam bastante de seus sambas e, sem grandes surpresas durante o desfile (como quebra de carros) devem voltar no Sábado.

Imagem marcou o ensaio da Mangueira – crianças sambando na parte alagada da pista – Fonte: Magaiver Fernandes/ Site Carnavalesco.

Outra que gosta do samba que escolheu é a Mocidade Independente de Padre Miguel. A bateria da escola fez uma grande apresentação durante o ensaio técnico. A Swingueira de Noel, que trocou de comando esse ano, também confirmou estar de volta à boa forma.

Na condição de vice e campeã de 2018, no próximo domingo, Tuiuti e Beija-Flor vão mostrar no Teste de Luz e Som – como se chama o último ensaio antes do carnaval –, seus trunfos para completar a turma do Sábado das Campeãs. O samba da escola de São Cristóvão não é tão poético quanto a obra-prima de 2018, mas tem sido muito bem cantado nos ensaios de rua. A Beija-Flor é uma potência do Carnaval e raramente se exibe mal.

Por tudo que vem sendo dito e ouvido, esse será um carnaval decidido nos detalhes. Escolas como Vila, Beija-Flor e Viradouro largam na frente no quesito financeiro, por contarem com patronos, só que Portela, Mangueira e Salgueiro, assim como a Tijuca, têm a força do chão, das comunidades.

O que precisa ficar bem claro é o seguinte: o desfile das escolas de samba não pode prescindir da temporada dos ensaios técnicos. Que os dirigentes considerem que eles são parte integrante da festa tanto quanto as alegorias e fantasias que saem da Cidade do Samba nos dias de carnaval.

Foto de destaque: Paulo Henrique Souza

22 de fev de 2019

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